Impenhorabilidade de aplicações de até 40 salários-mínimos
A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determina a impenhorabilidade de aplicações financeiras de até 40 salários-mínimos (aproximadamente R$ 52.800,00 por pessoa), representa uma mudança significativa no cenário jurídico brasileiro. Inicialmente pensada para assegurar o mínimo existencial de devedores, a decisão impacta diretamente a forma como empresas, credores e departamentos jurídicos corporativos gerenciam suas estratégias de cobrança e proteção patrimonial.
A decisão do STJ redefine a forma como as dívidas são executadas, exigindo ajustes imediatos nas estratégias de gestão de risco, contratos e garantias. Para bancos, grandes fornecedores e instituições financeiras, isso implica a necessidade de revisar seus modelos de negócios, especialmente no que diz respeito à recuperação de crédito.
Segundo o Banco Central, a inadimplência no crédito para pessoas físicas alcançou 5,4% em 2024. Com a nova regra, a recuperação de valores em casos de inadimplência será mais desafiadora, tornando essencial a revisão das políticas de crédito e o reforço de garantias contratuais.
“Invista R$ 50 mil e ganhe um cartão de crédito?”
Com a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), bancos que utilizam campanhas como “Invista R$ 50 mil e ganhe um cartão de crédito com garantia no investimento” precisarão reavaliar a viabilidade e a legalidade desse modelo de crédito garantido.
Impactos diretos para os Bancos:
- Inviabilidade da Execução Automática de Investimentos
Antes da decisão, os bancos utilizavam investimentos como garantia de pagamento em caso de inadimplência, especialmente em linhas de crédito vinculadas a produtos financeiros. Com a nova regra de impenhorabilidade, os bancos não poderão mais executar automaticamente aplicações financeiras de até R$ 52.800,00 para quitar dívidas de cartões de crédito ou empréstimos, pois esses valores estão protegidos por lei. - Risco Aumentado de Inadimplência
A impossibilidade de acessar esses recursos como garantia direta aumenta o risco de inadimplência. Isso exigirá ajustes nas políticas de crédito e uma análise mais criteriosa do perfil de risco do cliente, além de incentivar o uso de garantias alternativas, como alienação fiduciária ou seguro de crédito. - Necessidade de Reestruturação de Produtos Financeiros
Bancos terão que reformular campanhas de crédito atreladas a investimentos, deixando claro que valores abaixo do limite protegido pela nova decisão não podem ser executados. Isso pode reduzir o apelo comercial desses produtos e forçar a criação de novos modelos de crédito garantido.
Alternativas que os Bancos precisam considerar
Para mitigar os impactos da decisão, bancos deverão adotar garantias que não sejam afetadas pela impenhorabilidade. Algumas opções incluem:
- Alienação Fiduciária de Investimentos: Formalizar contratos em que o cliente transfere a titularidade do investimento para o banco até a quitação da dívida, escapando da proteção do STJ.
- Cessão Fiduciária de Recebíveis: Utilizar direitos creditórios ou receitas futuras como garantia de pagamento.
- Fiança Bancária ou Seguro Garantia: Produtos financeiros que asseguram o pagamento da dívida em caso de inadimplência, sem depender de execução de aplicações financeiras.
- Garantias Reais: Como imóveis, veículos ou outros bens móveis que possam ser penhorados.
Impactos na estruturação de garantias
Bens e aplicações financeiras, antes considerados ativos seguros para execução de dívidas, agora podem não estar mais disponíveis para cobrir inadimplências. Isso eleva a necessidade de buscar novos modelos de garantia, como alienações fiduciárias, contratos de fiança e outros instrumentos que não sejam afetados pela nova jurisprudência.
Para o setor empresarial, essa mudança representa não apenas um desafio, mas também uma oportunidade para revisar práticas de compliance, fortalecer o planejamento financeiro e inovar em soluções de proteção patrimonial.
Ativos financeiros que antes eram amplamente utilizados como garantia de dívidas agora não podem ser executados para cobrir inadimplências, criando um cenário de maior incerteza jurídica para credores e exigindo uma reavaliação completa das estratégias de mitigação de risco.
Essa mudança traz desafios especialmente para setores com grande exposição ao crédito, como instituições financeiras, grandes fornecedores, incorporadoras e empresas de infraestrutura.
A inviabilidade de penhorar ativos financeiros protegidos pressiona essas empresas a buscar modelos de garantia mais sólidos e seguros.
Contudo, essa mudança também cria oportunidades.
Entre as alternativas mais eficazes estão a alienação fiduciária de bens móveis e imóveis, os contratos de fiança bancária e o uso de seguros de crédito, instrumentos que oferecem maior proteção jurídica e financeira. Além disso, garantias reais, como penhor de recebíveis e cessão fiduciária de direitos creditórios, passam a ganhar relevância.
Para o setor empresarial, essa nova realidade impõe a necessidade de revisão das práticas de compliance, principalmente no que se refere à formalização de contratos e à gestão de garantias. Empresas precisarão adotar instrumentos jurídicos que ofereçam maior segurança em caso de inadimplência, revisando cláusulas contratuais e buscando mecanismos que reduzam a exposição a riscos.
Empresas podem inovar em soluções de proteção patrimonial e planejamento financeiro, desenvolvendo modelos de negócios mais resilientes. Isso inclui a adoção de tecnologias de monitoramento de crédito, ferramentas de big data para avaliação de riscos e a integração de práticas de gestão de riscos corporativos (ERM – Enterprise Risk Management).
Empresas que se anteciparem às mudanças e adaptarem suas políticas de crédito, gestão de garantias e compliance estarão mais preparadas para enfrentar a crescente complexidade jurídica e proteger seus interesses financeiros. Assim, a decisão do STJ não apenas desafia o setor empresarial, mas também impulsiona a evolução das práticas de gestão de risco e segurança patrimonial.
Riscos de manter o modelo atual
Se os bancos não adaptarem suas práticas, podem enfrentar ações judiciais de clientes inadimplentes que contestarão a execução de investimentos protegidos pela nova jurisprudência. Isso não só aumenta os custos com litígios, mas também pode prejudicar a reputação da instituição financeira no mercado.
Além disso, o não cumprimento da decisão do STJ pode gerar sanções administrativas, como multas aplicadas por órgãos de defesa do consumidor ou pela própria Justiça do Trabalho, caso ocorra execução irregular de garantias.
Documentações necessárias para Operações de Crédito Garantido
1. Contrato de Alienação Fiduciária
Para utilizar investimentos ou bens como garantia, o banco deve formalizar a transferência fiduciária de ativos. Esse contrato assegura que o bem passa a ser propriedade do banco até a quitação da dívida.
- Contrato detalhado de alienação fiduciária.
- Registro da alienação em cartório, quando aplicável.
- Cláusulas específicas sobre condições de execução da garantia.
2. Cessão Fiduciária de Direitos Creditórios
Bancos podem exigir a cessão de direitos sobre recebíveis (aluguéis, vendas parceladas ou contratos) como garantia de crédito.
- Contrato de cessão fiduciária de recebíveis.
- Registro formal em cartório ou no sistema eletrônico de garantias.
- Declaração de ciência do devedor cedido, quando necessário.
3. Contrato de Garantia Real
Para garantias com bens móveis ou imóveis, como veículos, equipamentos ou propriedades.
- Contrato de garantia real.
- Matrícula atualizada do imóvel ou documento de propriedade do bem.
- Registro da garantia em cartório ou no DETRAN (para veículos).
4. Fiança Bancária ou Seguro Garantia
Substituindo a execução direta de investimentos, bancos podem exigir fiança bancária ou seguro garantia como forma de cobertura de inadimplência.
- Apólice de seguro garantia com cláusulas claras sobre acionamento.
- Contrato de fiança bancária com definição de responsabilidades.
- Avaliação de crédito do fiador ou seguradora.
5. Instrumentos de Confissão de Dívida
Para reforçar a cobrança, bancos podem solicitar que clientes firmem uma confissão de dívida, formalizando a obrigação de pagamento.
- Documento de confissão de dívida com reconhecimento de firma.
- Cláusulas de penalidade e atualização monetária.
- Testemunhas ou registro em cartório, quando necessário.
6. Adendos Contratuais de Crédito
Bancos precisarão revisar contratos de crédito vigentes, adicionando cláusulas que reflitam a nova realidade da impenhorabilidade.
- Adendos contratuais que detalhem garantias alternativas.
- Termo de ciência e concordância do cliente.
- Atualização de políticas de crédito e cobrança.
7. Compliance e Política de Gestão de Garantias
O setor de compliance deve revisar suas políticas internas para garantir alinhamento com a decisão do STJ.
- Política interna de concessão de crédito atualizada.
- Procedimentos de análise de risco e concessão de garantias.
- Relatórios periódicos de auditoria e conformidade.
8. Registro no Sistema Nacional de Gravames (SNG)
Para bens móveis como veículos, o registro das garantias deve ser feito no SNG, assegurando prioridade em caso de inadimplência.
- Registro de gravame no sistema eletrônico.
- Contrato de garantia com cláusula de alienação fiduciária.
9. Comunicação ao Banco Central (BACEN)
Bancos precisam manter atualizados os registros de operações garantidas conforme as normas do BACEN, especialmente em casos de securitização ou cessão de crédito.
- Relatórios de crédito atualizados no Sistema de Informações de Crédito (SCR).
- Declaração de compliance com normas prudenciais.
Para operar de forma segura e em conformidade com a nova decisão do STJ, os bancos precisarão reforçar sua documentação de garantias e revisar contratos de crédito. A adoção de instrumentos como alienação fiduciária, cessão fiduciária, seguros de crédito e fianças bancárias será fundamental para proteger suas operações financeiras.
Empresas que mantêm uma gestão documental completa e alinhada às exigências legais estarão mais preparadas para minimizar riscos e garantir a sustentabilidade financeira de suas operações de crédito.